quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Ruínas

Um homem atravessa o deserto. O sol tinge as areias de dourado e seus passos cruzam para o sul, além daquele vale. O rosto do homem é a ruína que ele busca; pilares de concreto e pedras derrubadas povoam essas terras desabitadas. O homem se aproxima das ruínas e os esqueletos não o percebem.

"Os mortos estão fartos de nós", pensa o homem. Os ossos não respondem. Nunca houve humano que pudesse fazê-los falar. "Peço perdão pelo incômodo", fala o homem, "mas venho aqui em busca de algo que vocês possuem".  As caveiras deitadas no chão não respondem.

O homem olha para o horizonte. Além daquele deserto estava a cidade que abandonou, fugido. O seu pai lhe disse antes de sua peregrinação: "Vá ao sul e chegue nas ruínas. Lá, os mortos sussurrarão o seu caminho e você estará livre. Não volte".

O peregrino fez silêncio e tentou ouvir o som que os mortos fazem. O vento sibilava e além disso não havia nada. Serão essas as minhas ruínas?", pensou o peregrino. Para todo o lado, o deserto era só areia e no vento não havia voz que lhe guiasse.

O peregrino se ajoelhou ao lado dos ossos e pediu silenciosamente por guia. "Lá, os mortos sussurrarão o seu caminho e você estará livre". Uma rajada de vento cortou a ruína, levantou a areia e cegou o estrangeiro, que se levantou desesperado e tropeçou seu caminho para longe.

Fugindo da tempestade de areia, o estrangeiro correu para o sul. Em meio aos ventos violentos, ouviu nitidamente a voz de seu pai: "Não volte. Não volte. Não volte". O estrangeiro subiu uma duna e limpou seus olhos com o resto de água do seu cantil. Do alto do aclive, o estrangeiro viu, estendida sob si, uma cidade em ruínas, extensa como um labirinto, habitada por infinitas vozes sussurrantes.

O estrangeiro desce o aclive em direção às ruínas. Seus olhos molhados, cansados por eras e cheios de dor e beleza, se põem sobre as pedras secas. Em cima delas, um esqueleto cujas vestes ele reconhecia tão bem. "Vá ao sul e chegue nas ruínas. Lá, os mortos sussurraram o seu caminho e você estará livre. Não volte". Os ossos de seu pai, deitados na frente de sua cidade arruinada, fazem silêncio e o vento que os envolve não corre em nenhuma direção.

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